Monday, August 6, 2007

aos crescidos que choram

Os crescidos também choram. Mas o choro de criança é muito melhor (diz o adulto). O choro de criança é quase sempre curto, superficial, fútil. Não é verdade (diz a criança), quando choramos sentimos que o mundo vai acabar ali. Mas rapidamente se calam, basta um beijnho, um consolo, uma compensação (diz o adulto). Não é verdade, às vezes choramos porque temos uma dor e não conseguimos explicar, e às vezes choramos muito e os crescidos não entendem (diz a criança).

"Os crescidos não entendem". Mas as crianças aceitam os adultos. O que é um paradoxo, já que os adultos já foram crianças e as crianças ainda não chegaram a adultos.
Às vezes parece que há uma espécie de sabedoria pura e simples que se vai perdendo com a idade.

Lembro-me da primeira vez que vi a minha mãe chorar. Fiquei desconcertada, acho que, porque já não era tão criança. Se fosse, aceitava de outra forma. Pensava que não lhe tinham dado qualquer coisa de que gostava, ou que se tinha magoado no pé, ou que tinha sido picada por uma abelha. É traumático ver uma mãe ou um pai a chorar pela primeira vez quando já somos menos crianças. Acho que interpretamos a sua dor de outra forma, e nunca a conseguimos entender.

A minha mãe chorou porque com certeza chorava muitas vezes longe de nós desde que tinha perdido a mãe dela. Naquele dia irritou-se, justamente depois do meu pai lhe oferecer um ramo de flores (ainda mais desconcertante para mim), e chorou com força e convicção à nossa frente.

Os crescidos choram por coisas diferentes (diz a criança), e só choram quando estão muito, muito tristes. É verdade. Mas às vezes essa tristeza domina-nos e esquecemos aquela sabedoria de criança que nos ajudava a secar as lágrimas mesmo quando doía, mesmo quando nos sentíamos igualmente tristes.

Não choro à frente do meu filho. Sou incapaz. Porque acho que assim o protejo. De quê? Das tristezas que nos invadem? Das fraquezas que todos temos?
Às vezes questiono se não seria bom ele ver de vez em quando uma lágrima ou outra na minha cara, e entender desde cedo a dimensão humana da sua mãe.

Para que esteja mais preparado para me ver, um dia qualquer, a chorar (com força e convicção!)