Saturday, May 19, 2007

o bigos

Bigos é um nome inventado pelo teu pai. O teu pai sempre gostou de inventar palavras novas e construir um dicionario paralelo ao nosso.
Geralmente as crianças são o público-alvo do seu projecto. Na sua inocente aprendizagem aceitam sem questionar que aquela palavra tem um significado. E graças ao teu pai, pelo menos 100 palavras novas passaram a existir. O que bigos quer dizer nós sabemos. Não dá para explicar. Bigos és tu e pronto.

Viajei pela 3ª vez para longe sem ti. E por isso pela 3ª vez rezei não sei quantas avé-marias antes do avião levantar. Pela 3ª vez esqueci-me de rezar no momento da aterragem, talvez porque irracionalmente não me meta medo e já me sinta tão perto do chão que nada me assuste.
Desde que fui mãe o medo mudou de cara. Talvez peça ao teu pai para lhe dar outro nome, parece-me que um sinónimo não será suficiente para descrever a nova cara do medo.
Tu é que importas. Eu importo na medida em que te sou importante.
O que não quer dizer que tenha desistido do resto, de tudo o que não tenha a ver contigo.
Pelo contrário. Agora que tu existes faz ainda mais sentido investir em tudo o resto. Para que tenhas uma mãe mais feliz e mais experiente... Como vês tu é que importas.
Bigos, o nosso mais querido.
Se estás doente a vida segue diferente. Se choras o meu coração fica mais vazio. Se te magoas doi-me por dentro. Mas quando te ris fazes-me completa, plenamente feliz. E quando me abraças sinto o amor profundo que nos envolve. Consigo tocar-lhe.
Um dia vais crescer e vais conseguir entender estas palavras.
E vais misturar as do pai com as outras.
Mas as do pai, essas, vão ter sempre outro sabor.

Monday, May 7, 2007

vera

Gosto da tua alegria, aliás preciso dela. Quando falamos dos amigos a palavra "gostar" não cabe na alma. É como quando abraçamos os nossos filhos de amor e o aperto que lhe damos não é suficiente. O amor é sempre maior, e a amizade, se é amizade é grandiosa. Por isso repito, Amo a tua alegria. A tua alegria do viver e do estar. Por isso ao teu lado dificilmente me sinto pequena ou triste. Ao teu lado somos grandes, bonitos e fortes. Porque os teus olhos assim percorrem a paisagem que se lhes atravessa. Os teus olhos felizes, espertos, e tão amigos.
Preciso dessa alegria que amo. Preciso de ti e de poucas pessoas que para mim são as maiores, as melhores. Com quem estou sem precisar de falar. Nesse silêncio sempre tão cheio.
Fizeste 33 anos. Idade tão curta e já tão cheia. Por isso especial.
És bonita, e vives intensamente feliz. És mãe. Partilho a tua alegria com muita força.
Parabéns por tudo. Obrigada por tudo.
Contigo vai ser sempre assim.

Saturday, May 5, 2007

ausência

Vivo a pensar em ti.
Preciso de respostas, preciso de respostas, preciso de respostas.
Vivo agora com o teu terço colorido no bolso e vivo contigo ainda mais intensamente.
Porquê, Catarina? Porquê? Porquê?
Que desespero teres ido assim. Dói, maltrata, ofende.
Como tu dizias, daquela última vez "estou com uma dor tão grande, tão profunda, que não consigo explicar"
Estamos todos, os teus todos queridos, assim.
Todos doridos por dentro, e tão profundamente, que não conseguimos explicar
Estás mesmo aí? Olhas mesmo por nós? Transformaste-te uma estrela que consegue sentir o que sentimos? Sorrir quando sorrimos? Conseguirás ainda cheirar o mar, ou tocar o vento?
E as tuas filhas? Sentes a sua dor que é a de nós todos?
Sentes saudades nossas, minha querida?
Já não te podemos abraçar.
Viverei sempre contigo.

a tua casa

(ao som de erik satie)
A areia estava gelada e as ondas do mar ouviam-se no seu bater furioso e barulhento. Angustiada por estar só. O vento estava ameno e contrariava o dia escuro e triste.
Vi a tua casa ao fundo e apeteceu-me aproximar-me na certeza que te encontraria. Caminhei devagar e todos os momentos que partilhámos se atravessaram no meu caminho. Sentia que cada vez me afastava mais na convicção de te encontrar. Eram tantas lembranças para uma tão curta distância.
Cheguei e espreitei. Tu estavas de costas, vestida de branco e abraçavas as tuas três filhas. Chamei-te e não me ouviste. Gritei por ti. Olhaste para fora indiferente, a sorrir. Que saudades desse teu sorriso grande e feliz. Que saudades de te ver agarrada às tuas filhas. Que saudades da tua imagem viva e serena. Da tua expressão.
Comecei a recuar sem querer recuar. E houve um momento em que percebi que a música chegava ao fim e que o sonho ia ser interrompido. Preferi voltar para onde estava e guardar na minha memória a tua imagem.